Desbatismo
Por: Waldir Figueiredo Reccanello
Guarapuava, 27 de janeiro de 2004.
À Diocese de Guarapuava
A/C: Dom Antônio Wagner da Silva, SCJ - Bispo Diocesano e
Dom Giovanni Zerbini, SDB - Bispo Emérito
Prezados Senhores
Tendo sido batizado na igreja da paróquia Cristo Rei, da
cidade de
Cornélio Procópio - PR, no dia 08 de maio de 1977, sob o
nome Waldir
Figueiredo Reccanello (filho de Valdir Reccanello e Laís
Helena
Figueiredo Reccanello), é o presente para solicitar a
remoção
de meu nome daqueles registros de batismo com a seguinte
menção: "declarado apóstata por carta escrita datada de
27 de janeiro
de 2004".
Conseqüentemente, exijo que seja declara, incontinenti,
minha
excomunhão
nos termos do § 1.º do Cânone 1364 do Código Canônico:
"Apostata a
fide, haereticus vel schismaticus in excommunicationem latae
sententiae incurrit [...]".[1]
De fato, minhas convicções religiosas e filosóficas não
correspondem
àquelas das pessoas que estimaram em ter-me batizado.
Assim, e agindo desta maneira, os seus escrúpulos da verdade
- e os
meus - serão aliviados, e os seus registros ficarão isentos
de
qualquer ambiguidade.
Dos requisitos para a excomunhão
Afirma o Cânone 751 do Código Canônico: "Dicitur
haeresis, pertinax,
post receptum baptismum, alicuius veritatis fide divina et
catholica
credendae denegatio, aut de eadem pertinax dubidatio;
apostasia,
fidei christianae ex toto repudiatio; schisma, subiectiones
Summo
Pontifici aut communionis cum Eclesiae membris eidem
subditis
decretatio".[2]
Conforme lição de Carlos Corral Salvador e José Maria
Urteaga Embil
[3], o conceito de Apóstata aparece no cânone 751:
"Apostasia é o
repúdio total da fé cristã".
Existe este repúdio, quando se repudia o próprio fundamento
da fé
cristã, quer dizer, os mistérios da Trindade e da
Encarnação. É
apóstata da fé cristã quem rejeita Jesus Homem-Deus, pois a
fé cristã
consiste substancialmente na revelação que Deus fez, em
Jesus, Deus e
Homem.
É necessário, porém, distinguir o pecado de apostasia do
delito de
apostasia. O cânone 751 declara quem é Apóstata, no sentido
teológico
e moral. Mas, para que o pecado de apostasia seja também
delito de
apostasia, é preciso comprovar se existem elementos
essenciais do
delito, de modo especial os indicados no cânone 1330. Para
que exista
o delito de apostasia, é preciso que o repúdio da fé cristã,
enquanto
tal, seja externo; e, para que possa ser considerado
consumado, é
preciso que seja percebido por alguém.
Outro não é o caso!
Meu ato é externo, posto que escrito, e percebido por
alguém, os
senhores, que dele são testemunhas.
A pena prevista para o Apóstata, como também, em seu caso,
para o
herege e o cismático, é, de acordo com o cânone 1364, a
excomunhão
latae sententiae.
Ainda no cânone 751, define-se a Cisma como a recusa de
sujeição ao
Sumo Pontífice ou de comunhão com os membros da Igreja a ele
sujeitos. Quem se subtrai à obediência da Igreja e à
comunhão
constitui-se propriamente em Cismático, pois o pecado de
cisma
consiste em recusa de sujeição ao Sumo Pontífice ou de
comunhão com
os membros da Igreja a ele sujeitos, independentemente do
motivo que
haja para tanto. Esse fiel incidiria numa rejeição formal da
Igreja
católica, de que fala o cânone 1117.
Já a Heresia se trata da negação ou dúvida pertinaz de uma
verdade
que deve ser crida com fé divina e católica da parte de um
batizado.
No cânone 750[4] indicam-se quais as verdades de fé divina e
católica.
Com relação à gravidade do presente ato, e conforme
declarava o
Código Canônico de 1917, a pena é latae sententiae (ou
automática) se
vai unida, de tal forma, à lei ou ao preceito, que se
incorre nela
pelo próprio fato de se ter cometido o delito, não sendo
necessário
que o juiz ou o Superior a aplique. No mesmo Código,
definia-se
o "dolo", em matéria penal, como a vontade
manifesta de violar a lei.
Essas definições estão claras na presente missiva, não
podendo ser
negadas, além de continuar sendo válidas atualmente.
"Delito doloso"
será, pois, o delito cometido à ciência e consciência de que
se está
transgredindo um preceito legal.
Da motivação para a excomunhão
Reconheço que para a igreja é muito mais fácil reconhecer
outras
superstições, e que, não sendo familiarizada com o
racionalismo, ela
(a igreja) tem dificuldade em aceitar a decisão de renúncia
da fé
religiosa.
Portanto, como forma de confissão pública de minhas
intenções de ser
excomungado, e para ter certeza de que minha blasfêmia
esteja
suficientemente clara, afirmo:
Eu não sou mais um Católico Romano.
Eu não aceito a posição da igreja sobre o controle de
natalidade e
sobre o aborto.
Eu não acredito em orações, milagres ou em teologia, eu não
tenho
posto os pés em uma igreja por anos, exceto para casamentos
e
funerais, e eu não quero continuar a ser computado como
católico.
Eu sou ateu.
Eu, por meio desta, renuncio a todas as armadilhas da
religião.
Eu renuncio a todas as bênçãos, benefícios, graças,
santificações e
vantagens supostamente conferidas a mim por qualquer ato
religioso
realizado por mim ou em meu benefício no passado, no
presente ou no
futuro.
Eu condeno a monstruosa idéia do pecado original, e renuncio
a
qualquer batismo feito por mim ou em meu benefício com a
intenção de
retirar este dito pecado de mim.
Eu rejeito como ridícula a idéia dos sacrifícios expiatórios
e de
seus presumidos benefícios.
Eu não creio na existência de (d)eus ou de deuses, reinos
sobrenaturais ou vida após a morte, e não agirei como se
eles
existissem.
Eu não creio que qualquer livro, construção, local, pessoa
pensamento
ou ato seja santificados e eu não fingirei que eles são.
Eu me recuso à sujeição ao Sumo Pontífice da Igreja Católica
Apostólica Romana.
Eu não penso que orações sejam mais do que meras conversas
consigo
próprio, e não vou fingir que sejam.
Eu não creio que qualquer pessoa seja mais santificada que
qualquer
outra, ou que qualquer ser humano deva ser mais elevado em
relação a
outro por qualquer motivo, seja por ancestralidade, raça,
sexo,
ocupação, crença ou qualquer outra razão, e não fingirei que
seja.
Como pessoa racional e de princípios que sou, incomoda-me
muito o
fato de que alguém em algum lugar, possa me incluir com um
membro de
uma superstição irracional que tem causado, e ainda causa,
irreparáveis danos à humanidade, e com a qual estou em
profundo
desacordo.
Por favor, removam meu nome dos registros da igreja, efetivem
minha
excomunhão, e registrem que eu não mais sou um Católico
Romano.
Solicito, por fim, confirmação escrita deste ato e, por
favor, sejam
o mais rápido possível.
Não pense que esta carta foi escrita em algum momento de
furor insano
e inconseqüente contra sua instituição religiosa. Muito
antes e pelo
contrário.
Eu sei que esta carta envolve excomunhão e estou a par das
implicações e das conseqüências de meu ato.
E, para terminar, afirmo que faço isto de plena consciência,
de livre
e espontânea vontade, e com grande alegria por me ver livre
do fardo
de ser considerado católico.
Nestes termos
Cética, laica e atenciosamente
____________________________
Waldir Figueiredo Reccanello
Rua Álvaro Nuñez Cabeza de Vaca, 55 - Batel
Guarapuava - PR
CEP 85015-310
(42) 9104-1060
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